sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A CRÔNICA DO POSTO

No último feriado, apesar do tempo nublado, não chovia e a oportunidade de passar alguns dias em um lugar diferente parecia uma ótima idéia. Mas a vida é imprevisível e como não temos controle absoluto sobre as mudanças que nos aguardam, tive a surpresa de viver uma situação comum e aprender algumas lições através das coisas simples do nosso cotidiano.

Parei em um posto de GNV. Não estava com pressa. Havia tempo e aparentemente não havia engarrafamento pela frente. Como na maioria dos postos GNV, havia dois pontos de abastecimento de cada lado. Na minha frente, um carro havia se deslocado para o lado direito para iniciar seu abastecimento enquanto eu posicionava meu carro à frente do cone que separava a entrada do dois lados. Uma S10 vermelha e um Peugeout 206 já faziam uma pequena fila atrás do meu carro aguardando o andamento normal. Todos estávamos calmamente aguardando nossa vez para abastecer nossos automóveis como fazemos centenas de vezes durante o ano.

Neste momento, dois carros entraram à minha esquerda formando uma nova fila impedindo a minha entrada nos pontos de abastecimento do lado esquerdo. Observei a situação, refleti e achei uma verdadeira falta de respeito com todos que estávamos aguardando na fila. Mas já havia visto este tipo de situação em outros lugares. Às vezes o motorista entra distraído e não percebe a fila. Isso pode acontecer com qualquer um de nós. Por isso, calmamente caminhei até os carros, falei que já havia uma fila com três carros aguardando e pedi que posicionassem seus carros na fila.

O primeiro motorista reagiu de uma maneira bastante constrangida dizendo que não estava escrito de era fila única, mas aparentemente ia corrigir seu erro mesmo que contrariado. O segundo motorista, um jovem bastante indiferente reclamou, uma postura infelizmente muito comum em nossa juventude, mas com o recuo do primeiro carro provavelmente retornaria também. Mas surge um outro personagem em nossa história, o sobrinho do primeiro carro “fura-fila” aparece transtornado falando para seu tio manter seu carro onde estava porque ele sempre abastecia naquele posto e que ninguém tinha que se meter em nada. Com a atitude do sobrinho, o tio sentiu-se pressionado e manteve seu carro à minha frente, o jovem manteve sua postura indiferente e também manteve seu carro onde estava.

Esta situação me deixou indignado. Rapidamente fui ao gerente do posto e apresentei a situação. Falei que infelizmente estes dois carros estavam “furando fila” e que achava um absurdo eles levarem vantagens sobre os outros carros que corretamente aguardavam. Interessante salientar que fiquei sozinho nessa empreitada. Os outros prejudicados permaneciam imóveis em seus carros. Se eu tivesse sucesso, seria ótimo. A justiça seria feita e eles ganhariam tempo. Caso contrário, eles provavelmente reclamariam dos “espertos que não respeitam ninguém” e seguiriam suas vidas. No final, consegui com o gerente que a fila fosse respeitada. Dei a volta com meu carro e abasteci, assim como a S10 e o Peugeout 206 que estavam na fila corretamente. Os “furões de fila”, de certa forma também foram beneficiados porque deveriam ter esperado o abastecimento dos nossos carros. Buscou-se uma solução que evitasse mais conflitos.

O importante deste fato não foi o tempo que levei para abastecer o meu carro e nem a ordem de abastecimento. A questão central é que os personagens desta história estão em todos os lugares. Temos os espertos que segundo a “Lei de Gerson” tentam levar vantagem em tudo e o fazem mesmo em frente a seus familiares que de uma maneira corporativista, defendem os que são próximos porque, afinal de contas, o que vale é o sangue e esse negócio de justiça é muito bonito apenas no discurso. Eles têm seus “sobrinhos enfurecidos” que estão sempre interessados em entrar numa briga como se pudessem, desse modo, descarregar suas frustrações e desequilíbrios. Temos também os “jovens indiferentes” que vão usar as regras do sistema para seu benefício. Estão tão centrados em seu universo que a simples hipótese de precisarem se envolver no mundo exterior já os irrita. Os “justos omissos” que percebem que estão sendo prejudicados, conhecem seus direitos, mas não lutam para que sejam cumpridos, pois é arriscado demais se expor.

A verdade é que poucos de nós assumimos a responsabilidade de lutar pelo que é justo e correto e mesmo quando tentamos exercer nosso papel como agentes transformadores, corremos o risco de, em algumas áreas da nossa vida, atuarmos como vilões. O gerente do posto, um senhor bastante educado e calmo, me falava que a placa de fila única já havia sido quebrada e que mesmo quando ainda estava intacta, era desrespeitada. Ele me disse que era perigoso em nossos dias nos expormos para cobrar nossos direitos porque há muitas pessoas violentas e covardes. Respondi que era verdade, mas que se nós não pagarmos o preço para que a justiça seja uma realidade em todos os campos da nossa sociedade, estaremos entregues às vontades dos espertos, violentos, indiferentes e omissos. Precisamos refletir sobre esta pequena história, e pensar sobre quais papéis temos assumido em nossa vida.

por Frank Assis

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